UM PENSAMENTO TRISTE QUE DANÇA

                              Quem não se lembra do filme Perfume de Mulher, com Al Pacino, onde este era um militar cego contrata que um jovem para ajudá-lo a passar um final de semana. Ao chegarem na recepção de um hotel está tocando o tango “Por una cabeça”, imortalizado por Carlos Gardel. Ele percebe que ao seu lado está uma mulher e a convida para dançar e ela lhe disse que não podia, pois estava esperando o seu namorado e ele lhe diz que a vida se vive num momento – enquanto se espera –  e sai dançando com ela. Enfim: – Por uma cabeça/Todas as loucuras/Sua boca que beija/Apaga a tristeza/Acalma a amargura/Por uma cabeça/Se ela me esquece/Que me importa perder/Mil vezes a vida/Para que viver? –

                              Carlos Fuentes, no livro O Espelho Enterrado, pag. 290, Ed. Rocco -2001, nos conta que uma vez que esteve em Buenos Aires, foi a um baile onde tinha uma mulher cega que os homens a tirava para dançar e ela bailava com todos. Frente a este episódio, ele lembra um verso do poeta Santos Dicépolo que sentencia: “que o tango é um pensamento triste que dança”.

                                        Um homem cego e uma mulher cega dois episódios únicos que retratam a universalidade e a grandeza o tango.

                                        O tango – fruto de diversidade cultural como o samba –  conta histórias de frustações, nostalgias, fragilidades e inseguranças. Ele foi a primeira dança que os casais se abraçavam em público – uma afronta para a época – (Two to Tango – um destino partilhado), conforme nos conta o referido autor. Aliás não existe unanimidade sobre a origem do tango, pois esta palavra tem origem africana. Em alguns dialetos africanos ela significa “lugar fechado onde as pessoas se encontram”. E os escravos chamavam de tango o lugar onde eles se encontravam para tocar música.

                                        A magia do tango é encontrada em canções eternas: Camenito, Uno, La Cumparsita, El dia que me queiras, Tango to Evora, Cambalhache, Mano a Mano, Balada para um loco, Média Luz, Las Estrelas Zelosas, Que Es Um Sopro La Vida, Menção Honrosa, Sus Ojos Cerraro, Soledad e etc.

                                        Um passeio pelo tango pode ser feito em uma das mais espetaculares casas de tango do mundo: na Casa de Shows “Rojo Tango”, em Buenos Aires, onde tudo tem a sua magia e a força da cor vermelha. Vale cada centavo gasto, para se maravilhar com o legítimo tango e força telúrica desta música portenha. As reservas, nesta e em outras casas, podem ser feitas, via Internet ou por uma agência de viagens

                                        Ressalte-se, também, que existem outros tangos (finlandês, chinês, tango de salão e etc.), mas o original, universal e autêntico é o argentino. Existe, também, o tango brasileiro que floresceu por aqui com compositores brasileiros. E uma das vozes que melhor interpretou este gênero foi Nelson Gonçalves, mas este é assunto para outro artigo.

                    Encerro com um trecho de um dos mais espetaculares tangos:  Mi Buenos Aires Querido, de autoria de um brasileiro – Alfredo Le Pera – e imortalizado na voz da Carlos Gardel. Os dois morreram juntos no trágico acidente aéreo, na Colômbia, em 1935:

                              “Meu Buenos aires querido:  Quando te puder rever não haverás tristeza comigo… Terra florida/onde minha vida terminarei/Com teu amparo, não há desenganos/Voam-se os anos, se esquece a dor…”

                    Renato Gomes Nery. E-mail – rgnery@terra.com.br

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