SAUDOSA MALOCA

                                  

                         Adoniran Barbosa, nascido em Valinhos, no interior de São Paulo, foi um dos compositores mais originais e populares do Brasil. As suas canções usam temas e linguajar típico do interior. A sua marca é uma caixa de fósforo, onde ele era capaz de tocar e cantar uma canção acompanhada somente deste artefato.  Além do mais, apesar de simplicidade, retratam a alma simplória brasileira, onde encontram-se algumas verdades que somente um gênio é capaz de expressar.

                                    Conta-se que uma de suas canções mais famosas de nome Iracema é uma vingança. Ele e os amigos eram frequentadores de um bar onde sempre aparecia a bela e formosa Iracema. E um dos amigos era apaixonado por ela e foi incentivado a abordá-la, por eles, e foi destratado e humilhado, o que fez nascer contra ela um ressentimento. E o Adoniran disse: “eu vou matar ela” e assim nasceu Iracema, uma das suas mais belas composições, onde ela é atropelada e “pinchada” no chão por um carro, em plena avenida São João. Esta música está imortalizada, entre outros, pela voz sem igual de uma das nossas maiores intérpretes:  Elis Regina.

                              Quem não se lembra do “Trem das Onze” que retrata o drama comum de um filho medroso, de uma mãe ciumenta e uma namorada preterida. Os maiores intérpretes que imortalizaram as canções de Adoniram foi a genial banda “Demônios da Garoa”. Um dos seus membros, afirmou que dificilmente eles existiriam se não fossem as suas canções e vice-versa.

                              Porque estou aqui, as voltas com um tema que não domino: a música. Assim como eu, inúmeros outros apaixonados somos tangidos pela sensibilidade de identificar as coisas belas que brotam das entranhas deste Brasil profundo. E, se temos de sobra, são compositores geniais e, um deles, atendia pelo nome de Adoniran Barbosa.

                              No artigo anterior, aqui nesta coluna, eu termino o texto louvando a genialidade de Adoniram, ao numa canção simples, retratar traços  da nossa forma de ser e se portar: Ói nóis aqui traveis!

                              Louvo aqui neste texto, o que já fiz em outros, a capacidade de alguns autores brasileiros de sintetizar o mundo todo num pequeno texto, o que outros não seriam capazes de expressar num tratado. Os traços do nosso pendor conformista, a fatalidade e a esperança de que tudo vai mudar se “Deus quiser”, estão imortalizados, por Adoniran, na canção Saudosa Maloca, que tomo a liberdade de transcrever para encerrar este texto, a fim de aprisionar um pouco da sua genialidade que nem de longe sou capaz de alcançar.


…….Era uma casa velha um palacete assobradado

Foi aqui seu moço
Que eu, Mato Grosso e o Joca
Construímos nossa maloca
Mais um dia nem quero me lembrar
Veio os homens com as ferramentas
O dono mando derrubá

Peguemo’ toda’ nossas coisas
E fumos pro meio da rua
Apreciar a demolição
Que tristeza que eu sentia
Cada táuba que caia
Doía no coração

Mato Grosso quis gritar
Mas em cima eu falei
Os homens está ‘cá razão
Nós arranja outro lugar

Só se conformemos quando o Joca falou
“Deus dá o frio conforme o cobertor”
E hoje nós pega a paia nas grama do jardim

E pra esquecer nós cantemos assim
Saudosa maloca, maloca querida
Que din donde nós passemos dias feliz de nossa vida.

                    Renato Gomes Nery. E-mail – rgnery@terra.com.br Site – www.renatogomesnery.com.br

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